24/07/2012

O FILÓSOFO E A CRIANÇA

(com a grafia original)

O filósofo Sintenis imaginou que, se o homem não recebesse instrução religiosa, não teria idéia da divindade e que, coisa enfadonha, passaria a vida sôbre a terra sem ter idéia de um Deus Criador.

Então procurou uma linda criança, apenas sabendo balbuciar seu nome, e que, por conseqüência, jamais ouvira falar de Deus. Uma vez na posse do objeto de seus desejos, afastou-a de todo o mundo, deu-lhe um palácio e um jardim cheio de encantadores prados, fora dos quais não poderia pôr os pés. Velou com cuidado que nenhuma pessoa lhe viesse falar de Deus; tirou tôdas as imagens, tôdas as estátuas, todos os livros que pudessem entranhar esta idéia nela. Em uma palavra, de sua casa de campo, fêz um deserto. 

A criança só teve então por mestre a natureza. Mais tarde, o filósofo Sintenis constituiu-se seu professor e intérprete da natureza. Esta educação seguiu-se, durante muitos anos, sem nenhum perigo. À medida que a criança crescia, sua inteligência robustecia; mas ela jamais ouviu falar de Deus, e isto fazia a alegria de seu mestre. Logo, dizia consigo mesmo, eu poderia apresentar, à Academia de Paris, um jovem que jamais imaginou que houvesse um Deus.

Um dia, muito cedo, logo que o sol principiou a clarear o céu, o filósofo fazia um passeio solitário no bosque que, e viu, de repente, o jovem descer ao jardim. “Aonde irá com tanta pressa? Por que sai êle a esta hora matinal?", dizia consigo mesmo. E, escondido por trás das árvores do bosque, seguiu com a vista e viu-o subir a uma elevação que dominava um lago no cristal do qual se refletiam todos os resplendores do sol nascente.

Era a hora do despertar das aves, era o momento em que, alegremente e batendo asas, elas saudavam a volta do sol com seus cantos harmoniosos. Era o momento em que as flores cravejadas de orvalho e abrindo suas corolas, exalavam para o céu seus mais delicados perfumes.

De joelhos, no meio das flores, com as quais êle rivalizava em beleza, o jovem misturou sua voz harmoniosa aos concertos das aves, e, vendo o sol nascente: "Ó sol! quanto és belo! Êle te fêz esplêndido, o Criador que te enviou ao mundo. Ó sol, vês, por acaso, o Criador de tôdas as coisas? Se o vês, dize-lhe que eu muito o amo, e que muito desejaria conhecê-lo; se o vês, dá-lhe de minha parte um beijo sôbre a sua eterna fronte." Calou-se e, levando a mão aos lábios, enviou-lhe beijos para levar a êste Deus que amava de todo o coração.

Escondido nas árvores, Sintenis tudo ouviu. Comoveu-se quase até às lágrimas, e, tremendo, correu até ao montículo e, abraçando o jovem com transporte, exclamou: "Quem te disse que havia no céu um Criador?" "Quem mo disse? Foi êsse sol, que não podíeis colocar no alto, porque sois muito pequeno para isso. Quem mo disse? Foram estas plantas, que sobem da terra sem que vosso dedo esteja aí para as lançar para fora; foi este coração, que nem vós nem eu fazemos bater dentro do peito”. O jovem, falando, estava encantador. Seu semblante era tão brilhante, que semelhava o mesmo sol.

O filósofo, perante esta linguagem sublime, que estava bem longe de esperar, pôs-se a chorar, bateu com a mão na fronte e exclamou: Ó incrédulos, vós sois uns impostores!"

Afonso Celso

(Quarto Livro de Leitura, 1945 - pagina 13 - 17ª ed - Ed Vozes)

12/07/2012

O PASTOR DAS OVELHAS

Uma senhora idosa, enferma, enfrentava sérias dificuldades financeiras, além de passar por constantes injustiças e ingratidão por parte de alguns familiares, que usufruíam de boa situação sócio-econômica.

A despeito dos percalços, a senhora mantinha uma impassível atitude de serenidade e discrição; semblante risonho, demonstrando uma cativante bondade. Jamais confidenciava ou reclamava, a quem quer que fosse acerca das aflições ou da penúria do seu viver diário.

Membro fiel de uma igreja evangélica, em uma zona rural, procurava ser assídua aos cultos, sendo igual e carinhosamente estimada pelos membros da comunidade.

Certa vez o ministro de sua igreja foi visitá-la, e após a habitual assistência pastoral, com leitura da Bíblia e oração, indagou:

- Diante das inúmeras dificuldades a senhora consegue dormir bem?

- Na verdade não consigo dormir muito bem, respondeu ela com humildade.

- Acho que a irmã fecha os olhos e começa a contar as ovelhas, pulando a cerca, até que o sono chegue!, brincou o ministro.

- Não, disse ela. Apenas fecho os olhos e procuro conversar com o Grande Pastor das Ovelhas!

A. Dudley Dennison Jr.

Revista Círculo de Oração 19 / Abr a Jun, 87 - CPAD